Ele morou 18 anos nos Estados Unidos e já cozinhou para Julia Child, chef que popularizou a gastronomia francesa na TV (Lembra-se dela em Julie & Julia, estrelado por Meryl Streep?), e diversas estrelas do basquete, mas ele não liga muito para isso. Como a gastronomia é inusitada, é normal que celebridades queiram conhecer o Poco Tapas quando estão de passagem por Curitiba. “Para mim não importa quem entra aqui, vou tratar da mesma maneira. Se ­fizer mais especial para alguém, quer dizer que estou fazendo menos especial para os outros, e tento fazer meu melhor para todo mundo.” O restaurante foi uma grande conquista desse catarinense que nunca teve nada de mão beijada. Criado em Piçarras pela bisavó, aos 15 anos foi morar com a mãe nos EUA e começou a trabalhar em uma pizzaria. Ali começou sua paixão pela gastronomia e, após passar por vários restaurantes, faculdade e pós, começou a aprender gastronomia molecular sozinho. Aliás, ele realizou muitas coisas sozinho no Poco Tapas, que antigamente era um salão de cabeleireiro. “Olhei por fora e pensei que tinha potencial, mas a estrutura era totalmente diferente. Derrubei paredes e fi­z muitas coisas, até porque abri o restaurante sem dinheiro. Tudo que eu poderia fazer com as próprias mãos aqui dentro eu ­fiz, até as mesas!”

 

O chef Fábio Mattos, dono do Poco Tapas (foto: Patrícia Amâncio)
O chef Fábio Mattos, dono do Poco Tapas (foto: Patrícia Amâncio)

A GASTRONOMIA CHEGOU CEDO NA SUA VIDA?

Minha mãe saiu de casa quando eu era pequeno, meu pai casou de novo, e quem me criou foi minha bisavó Florência, então a maior relação foi com ela. A bisa fazia de tudo, mas do que eu mais gostava era o nhoque, tanto que tem no meu cardápio. Não tinha lata em casa, era tudo fresco. No quintal tinha uma horta e diversos tipos de fruta, acho que nunca compramos frutas na vida!

COMO FOI SUA TRAJETÓRIA NOS ESTADOS UNIDOS?

Eu estudava e depois da escola trabalhava na pizzaria que era do outro lado da rua. O dono, Randy, me ensinou tudo que eu precisava saber. Com o tempo acabei perdendo o contato com ele porque me mudei, mas se pudesse gostaria de agradecer. Ele me colocou nesse ramo, me fez gostar e me falava coisas que hoje falo para meu braço direito no restaurante. Ele dizia: “Venha trabalhar todo dia feliz. Se essa não é a parte mais feliz do seu dia, procura outro emprego onde você vai encontrar isso”.

 

 

E DEPOIS, PARA ONDE VOCÊ FOI?

Fui subgerente de uma churrascaria, barman, garçom, lavei louça, já ­fiz tudo! Também ­fiz faculdade de Gastronomia na Califórnia, mas queria me especializar, então fui para Massachusetts. Lá o dono da escola gostou de mim e me ensinou muito, eu trabalhava para ele para poder pagar os estudos. Depois da minha formação, fui para a Flórida trabalhar no Sheraton. Dali fui para um monte de restaurantes tentando ver onde me encaixava, depois fui para Nova York onde trabalhei para uma empresa que tinha cinco restaurantes, e eu fazia a criação dos pratos.

 

COMO FOI COZINHAR PARA A JULIA CHILD?

Era um jantar com oito pratos e eu ­fiz um deles. Um pato com molho de laranja engrossado em pimenta tricolor que, na época, achei maravilhoso – hoje vejo que não era nada demais. Mas ela era um amor de pessoa, poderia ser uma esnobe, mas fez questão de tirar foto e abraçar todo mundo! Isso foi há muito tempo, eu deveria ter uns 24 anos.

 

POR QUE ABRIU O RESTAURANTE EM CURITIBA?

Eu tinha vindo para o Brasil passar férias, e meu pai me convenceu a ­ficar e abrir algo. Fiz uma pesquisa de tapas internacionais, e não tinha nada nesse estilo, aí abri o primeiro Poco Tapas em Joinville. Fiquei lá dois anos e percebi que 80% dos meus clientes eram de Curitiba, então fez sentido vir para cá.

 

COMO VOCÊ VÊ A GASTRONOMIA POR AQUI?

A cidade é pouco valorizada pela gastronomia. É triste ver premiações, festivais maiores, tudo só em São Paulo e no Rio de Janeiro. Mas acho Curitiba um lugar bom, com grande variedade de comidas e está crescendo cada vez mais.

 

Prato servido no restaurante, que foi indicado pelo TripAdvisor como um dos melhores da América Latina (foto: Patrícia Amâncio)
Prato servido no restaurante, que foi indicado pelo TripAdvisor como o sexto melhor da América Latina (foto: Patrícia Amâncio)

 

E A ACEITAÇÃO DO RESTAURANTE?

Excelente! Já ganhamos várias premiações internacionais, fomos eleitos o terceiro melhor restaurante do Brasil e sexto melhor da América Latina pelo TripAdvisor. O mais importante é que não são premiações políticas, são as pessoas que escolhem. Ano passado competimos com 3 milhões de restaurantes e somos o número seis da América Latina! Até me assustei quando vi, é muita coisa. Ainda mais para quem começou do nada, não tem uma estrutura gigante nem investimento.

 

POR QUE GASTRONOMIA MOLECULAR?

Por que não? É o que tem de novo. A tecnologia existe para isso! Conheci há uns 10/12 anos em Nova York, comecei a ouvir falar do Ferran Adrià, eleito o melhor chef do mundo cinco anos seguidos, ele fazia e eu achava o máximo! Só que ainda não tinha produtos e equipamentos disponíveis. Quando começou a fi­car disponível comecei a trabalhar, inventar e colocar pequenos toques nos pratos. Já ­z muita coisa que não deu certo, até hoje faço porque continuo testando coisas novas.