Por Jean Sigel

A espécie humana parece gostar de profecias. E em tempos difíceis e incertos como os atuais então, se alguém criar um aplicativo de leitura de código de leitura da sua mão para ver o futuro, terá grandes chances de ser acelerado no Vale do Silício e virar unicórnio. Estamos todos a flor da pele. Até Nostradamus voltou a ser citado e as teorias conspiratórias parecem aquecer nosso imaginário. Tudo porque nós, seres humanos, queremos prever o futuro de qualquer maneira para podermos planejar o presente com mais segurança e estabilidade. Virou moda agora até no mundo dos negócios. Há os que se auto denominam futurólogos e muitos desses inclusive têm feito lives compartilhando profecias que acalmam temporariamente. Coaches de vida, gurus e mentores relâmpagos – muitos sem experiência de vida – pipocam ainda mais num momento de fragilização das pessoas. Lamento informar, mas, ninguém é capaz de prever o futuro. Tentar recriá-lo de forma diferente, sim, mas predizer o futuro, não. Ainda mais em um mundo tão instável, incerto e mutante como já há tempos vivemos. Agora então, nem se fala. Transformações sem precedentes já têm mudado nossa história, principalmente nos últimos 30 anos, de forma veloz e revolucionária e nossas narrativas de vida não poderiam ser mais as mesmas. Mas insistimos em preservá-las com medo da mudança e para nos mantermos com a falsa sensação de estabilidade e controle. 

Optamos por não mudar e resistimos à evolução do mundo, mantendo nossos ambientes de aprendizagem obsoletos e fossilizados. Empresas, escolas e governos nos “treinaram” – muito mal por sinal – para uma narrativa de certezas, estabilidade e padrões. Essa narrativa agora, ruiu. Há muito tempo já deveríamos fazer parte de uma nova forma de viver que já acontece por aí. Baseada em experiências, dúvidas, criatividade e mudança. Aliás essa última palavra talvez seja a única que poderia ser aceita numa bola de cristal. O futuro do mundo é a mudança, constante. Ponto. O resto ou é achismo ou no máximo podemos chamar de tendências baseadas em dados, mas que não garantem certeza. 

Tenho recebido também diversos dossiês de futurismo de todas as partes de como o mundo será pós COVID19. Alguns muito sérios, úteis e com grande embasamento, e outros – a maioria eu diria – rasos, óbvios e até oportunistas. Mas todos têm algo em comum: falam do mundo de fora para dentro. De um mundo objetivo e de como deveríamos dirigir nossos negócios, vidas e nossas profissões a partir dele. E acho sinceramente que o buraco, é muito, muito mais embaixo. 

Por isso agora, feita essa provocação, divido minhas reflexões de como acho que o mundo e nossas profissões e trabalhos serão à partir dessa pandemia. Sem profecias ou futurologia – uma experiência pessoal apenas, sem verdade única – mas que tem funcionado pra mim nos últimos 20 anos. 

O mundo não é objetivo. O mundo é subjetivo. E também somos nós, seres humanos. A natureza e seus ciclos evoluem na subjetividade se adaptando às mudanças de forma contínua. Somos feitos de subjetividade, de emoção, de incerteza e dúvidas. Mas fomos treinados para a objetividade e agora lutamos contra ela, pois parece ter perdido completamente o sentido. Aliás o que fazia sentido há pouco mais de um mês, já não sentimos mais.  E fará menos ainda no futuro.

Dizer que o mundo do trabalho será também online e remoto é uma obviedade até perigosa pois reduz a discussão à tecnologia apenas e acredito mais num modelo híbrido e holístico onde o digital ganha mais espaço, mas o presencial será ainda mais valorizado, afinal somos seres sociais e precisamos estar em comunidade. Um modo de viver que equilibre o OFFline com o ONline. Talvez um modo onLIFE? Um professor do MIT e especialista em inteligência artificial do Life Institute me compartilhou uma reflexão intrigante num evento. “A pergunta não é SE devemos usar inteligência artificial. A pergunta é para que devemos usar inteligência artificial? Da mesma forma que a pergunta não é – Como o mundo será? Mas que mundo você quer para viver?” 

Citar profissões em ascensão nos ajuda a entender o mundo do trabalho, mas é preciso entender que talvez nossos filhos terão quatro ou cinco profissões diferentes ao longo de sua vida. Assim como estarmos preparados para diversos trabalhos será mais importante que estarmos preparados para empregos. Empregos são do mundo objetivo e da estabilidade que já não existe. E empregos são escassos. Enquanto trabalhos são do mundo subjetivo, incerto. Mas são abundantes – para aqueles que se adaptam. Muitos relatórios falam de trabalhos com mais propósito, qualidade de vida, bem estar. Não é a COVID19 que garantirá tudo isso na pós pandemia. Somos nós e nossas escolhas. Aliás, muita coisa voltará ao piloto automático em poucos meses. Pessoas continuarão sem tempo, obcecadas pela produção e o dinheiro, e darão graças a Deus de seus filhos retornarem para aquela sala de aula do século XX. Afinal, lembre-se que preferimos a estabilidade à mudança. Os que mudarão para buscar propósito, qualidade de vida e bem estar serão aqueles que olharão para dentro e não para os discursos prontos. Que investirão em conhecimento, novas habilidades e depositarão mais sabedoria e simplicidade em suas contas pessoais. 


Por isso a única solução para um mundo mutante que eu ousaria compartilhar – não como profecia que fique claro – mas que tem feito uma enorme diferença na minha vida, seria: Agora, mais do que nunca, pare e pergunte a você mesmo – Quem é você? Quais seus reais talentos? O que deseja fazer no mundo? E como quer viver nesse mundo? Parece simples e não tão sofisticado quanto os dossiês de futuro ou as palavras de um consultor. Eu sei, também achava há 20 anos e esperava que a objetividade do mundo me desse as respostas prontas. Mas as respostas só começaram a fazer sentido para este curitibano inquieto quando parei, refleti e me fiz essas perguntas. Nunca havia perguntado quem eu realmente era, que talentos quase imbatíveis eu poderia ter e o que eu queria viver nesse mundo. Uma pergunta até ingênua, mas necessária. A pergunta, antes, era de fora para dentro. Baseada em que os outros diziam. No que a sociedade, a academia, o trabalho e o mundo diziam. E por isso, eu simplesmente cumpria com dedicação uma narrativa que simplesmente não era a minha. Mas uma narrativa só faz sentido realmente, se fizer sentido pra você – de dentro pra fora. É a sua história e como ela impacta o mundo. O mundo muda, mudam-se as perguntas. Mas que sejam feitas primeiro de dentro pra fora, sempre. Em um exercício de autoconhecimento constante. Aumentar nosso repertório de conhecimento e aprender com outras pessoas sem dúvida importam, mas entender seu próprio sistema operacional e valorizar sua essência é talvez a atitude mais segura em um mundo inseguro. Desenvolver seus talentos únicos, que talvez você nem os conheça ainda, e estimular sua capacidade criativa e autoral lhe darão a confiança e o equilíbrio necessário para as mudanças de agora e do futuro. Pergunte ao seu coração, primeiro. Como quer viver nesse mundo?

Jean Sigel

Jean Sigel é pai de duas meninas, empreendedor por natureza e Co-fundador da Escola de Criatividade. Autor de O Melhor da Vida – Simples e de Graça –  e um dos autores do O Grande Livro da Criatividade.