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Foto: Márcia Kohatsu



Por Bruna Kamaroski

 

Me chamo Bruna, sou fotógrafa, mãe da Clara e filha da Geni, uma senhora que sempre foi muito tímida, teve uma vida árdua desde pequena, trabalhou com meus avós no sítio e se casou cedo em busca de uma vida melhor. A costura escolheu minha mãe e esta foi sua profissão por 40 anos, sempre trabalhando muito para sustentar sozinha a família. Após ser demitida do último emprego, teve depressão e durante esse processo comecei a reparar pequenos lapsos de memória. Como ficaram mais frequentes, comecei a investigar,  sentia que tinha algo além da depressão. No começo ela trocava os nomes, perguntava várias vezes o mesmo assunto, até que em 2015 o que eu mais temia foi comprovado: minha mãe foi diagnosticada com Alzheimer precoce, uma demência que será cada vez mais comum em pessoas abaixo de 60 anos, em razão do ritmo de vida, má alimentação e estresse.

No dia em que recebi a notícia do neurologista, meu mundo veio ao chão, levei alguns dias para absorver tudo o que estava acontecendo sabe quando você dorme e tem um pesadelo? Mas infelizmente eu estava bem acordada. Em um momento me vi sem saber o que fazer, mas tive que ser forte e compreender que eu não poderia mudar nada, e sim ajudá-la a ter uma qualidade de vida melhor e levar a doença de forma mais leve.

Hoje cuido diretamente dela em consultas, exames, medicações e vivemos juntas suas grandes oscilações. Aprendi a lidar com um portador de Alzheimer e suas dificuldades que surgem no dia a dia, vejo seu olhar perdido mas feliz quando me vê. Sendo mãe também, sinto todos os sentimentos que ela sentiu um dia comigo, de cuidados, preocupações e carinho, e hoje me tornei mãe da minha mãe.

Como fotógrafa, sinto que depois da doença não só eu mudei, mas a minha fotografia também. Trabalho muito esse resgate da memória, a herança da memória, principalmente neste mundo tão tecnológico, em que tudo passa por uma tela de celular e desaparece em 24 horas.  Com meus clientes, busco ir além, saber sobre cada família e cada história particular, não busco fazer apenas imagens estéticas, mas, sim, registros que tragam sentimentos, que sejam dignos de estarem em uma caixa de sapatos daqui a alguns anos.

No Natal de 2018, presenteei minha mãe com várias imagens em molduras e coloquei no quarto em frente à sua cama, para ela acordar todos os dias e se lembrar de várias fases de sua vida, principalmente do diploma de corte e costura do qual tanto se orgulha. Esse resgate da memória afetiva fez bem a ela, são memórias de uma vida. E mostra, mais do que nunca, que “você importa para mim”.