É muito bom dar um tempo na rotina, descobrir novos horizontes e costumes, conhecer gente diferente. Tivemos a oportunidade de viver momentos incríveis em uma viagem que reuniu gastronomia e espiritualidade no Sul da França. Mas antes que você pense que a ideia era só comer e rezar, devo dizer que essa viagem foi muito mais. Foi uma verdadeira aula de história por uma das regiões mais impactadas pelas Cruzadas, as guerras religiosas. 

Nas cidades do Languedoc-Roussillon, cada espaço parece contar uma história. Praticamente todos os principais centros da região, Montpellier, Albi, Narbonne, Carcassone e Béziers, já existiam nos tempos dos romanos. Na Idade Média, entre os séculos XII e XIII, eles foram polos vitais de um importante movimento herético medieval conhecido como catarismo. Os cátaros – heréticos cristãos medievais – abalaram os alicerces da Igreja Católica e foram fundamentais para o desenvolvimento de uma religiosidade mais pura.

Até hoje meta de peregrinações religiosas e culturais, o Languedoc-Roussillon oferece grande variedade de roteiros para quem deseja visitar seus castelos, catedrais, fortalezas e museus dentro do espírito que caracterizava a tradição cátara. Toda a região possui excelente infraestrutura para o turismo, nos transportes, na hotelaria e na gastronomia, com vários restaurantes estrelados pelo Guia Michelin.

A energia do lugar, que era habitado pelos cátaros e templários, convida a uma reflexão sobre como está a nossa fé. Os relatos das disputas nos ensinam a olhar para o nosso dia e buscar uma vida mais simples, mais verdadeira. Nossa viagem foi promovida pelo Mãos Sem Fronteiras, uma organização internacional que promove o bem-estar, da qual a VIVER é parceira aqui no Brasil. A sede fica em Belvianes-et-Cavirac e foi onde ficamos e pudemos conhecer um pouco mais sobre meditação e estimulação neural, já bastante difundidos por aqui.  

Conhecemos muitos lugares especiais, selecionei alguns imperdíveis para dividir com você um pouquinho da história de cada um.

A última fortaleza

O castelo cátaro Quéribus é um memorial impressionante do século XIII. Mesmo com um grande histórico de disputas, foi somente em 1255 que essa fortaleza montanhosa caiu para os cavaleiros católicos franceses. Quéribus foi o último dos castelos cátaros, a sua captura representa o fim do movimento organizado de resistência à Igreja Católica e seus desmandos. O castelo é alto e isolado. A caminhada exaustiva até a montanha é recompensada pela arquitetura, história e principalmente pela vista. A maior parte do castelo está bem preservada, os fortes ventos uivando por toda a estrutura proporcionam um efeito quase surreal. De Quéribus, é possível observar os Pirineus de uma lado e o Mediterrâneo do outro.

O primeiro espumante do mundo

A 25 quilômetros de Carcassone conhecemos Limoux, que faz parte do Languedoc, a região vinícola da costa mediterrânea da França, onde a vinicultura foi iniciada pelos gregos e desenvolvida pelos romanos.

A estrela da região é a Blanquette de Limoux, reconhecida pelo Institut National de L’Origine et de la Qualité (INAO) como o primeiro vinho espumante do mundo. Documentos históricos de 1544 atestam que o Sieur d’Arques, um poderoso senhor feudal do Razès, comemorava suas vitórias militares com a Blanquette, feita de uvas mauzac, chamada na região de blanquette, isto é, branquinha, por conta de sua cor clara.

Somente duzentos anos depois que Dom Pérignon (1639-1715) desenvolveu o método champenoise. O que faltou então para que a Blanquette ficasse famosa como sua coirmã, a Champagne, com certeza foi a ausência de um autor, um pai que colocasse foco na divulgação por toda a Europa. Mas atualmente a “branquinha” dos franceses vai muito bem, obrigado, e tem uma produção anual de mais de 4 milhões de garrafas.

Caverna de Limousis

A Caverna de Limousis fica pertinho de Carcassone e é uma verdadeira viagem ao centro da Terra. Com centenas de formações minerais multimilenárias, as estalactites e estalagmites. A Pré-História está presente nos vestígios de arranhões deixados por ursos nas paredes dos primeiros cômodos, além de ferramentas, cerâmica e ossos neolíticos. Durante o percurso, encontra-se um lago com água em tom de azul-piscina que encanta e ali a gente perde alguns minutos para admirar e fotografar todos os detalhes, confesso que fiquei com vontade de mergulhar mesmo estando muito frio. Na última gruta tem um maravilhoso lustre de aragonita, único no mundo, suas dimensões são 4 metros de altura e 10 metros de largura.

A Apaixonante Carcassonne

Carcassonne é surpreendente, localizada bem no sul da França, quase na fronteira com a Espanha essa pequena, mas belíssima cidade medieval, concentra no seu centro histórico –  conhecido como La Cité – uma cidadela medieval bastante preservada, erguida no topo de uma enorme colina de mais de 550 metros de altitude, às margens do rio Aude. La Cité é uma das maiores construções medievais de toda a Europa. Suas muralhas duplas são coroadas por 32 torres pontiagudas e, do lado de dentro, está o belo Château Comtal, um castelo do século 12 que pode ser visitado e até andar no topo das suas muralhas.

Vale lembrar que Carcassonne foi amplamente dominada pelos povos cátaros, religiosos fundamentalistas, que foram perseguidos e massacrados pelas Cruzadas do século 13. Além de visitar o castelo e andar pelas ruelas calçadas em pedra no centrinho, visitamos a catedral e namoramos as vitrines das lojas de doces.

Para o almoço a dica é ir de cassoulet, o prato tradicional da cidade, uma espécie de sopa bem cremosa feita com feijão branco e carnes de caça. A cidadela iluminada, à noite, é ainda mais impressionante, parece uma enorme maquete de tão perfeita.

Só a fé explica

Lourdes foi um dos pontos altos da viagem e é bem difícil explicar o por quê. É daquelas coisas que só a fé explica. Quando se chega ao Santuário construído sobre a gruta em que em 1858 a menina Bernadette Soubirous teve a visão da Virgem Maria, parece que uma energia muito maior toma conta de você. As visões de Bernadette foram reconhecidas pelo Vaticano e a garota foi beatificada em 1933 e desde então Lourdes é um dos maiores centros de peregrinação do mundo católico, à semelhança do Santuário de Nossa Senhora de Fátima em Portugal, Aparecida no Brasil, Guadalupe no México e da Basílica de São Pedro, no Vaticano. 

A Basílica, lembra o gesto bíblico dos braços abertos, símbolo mundial da fraternidade entre os homens. A cidade possui mais hotéis per capita do que qualquer outro lugar da França e apesar de todo o comércio no seu entorno, a cidade não desaponta. Muita gente que programa essa visita a Lourdes, aproximadamente seis milhões de pessoas, vai em busca de curas, agradecimentos e de fortalecimento na fé. Lourdes é um daqueles destinos que é preciso viver.