Lima vem se reinventando nos últimos anos. Os próprios peruanos ainda se surpreendem com a transformação da capital de quase 10 milhões de habitantes. Ainda que tenha uma boa dose de caos, sobretudo no trânsito, a cidade está mais colorida e radiante.

Vale lembrar que até pouco tempo atrás, o brasileiro que fosse para Machu Picchu, se pudesse, voaria direto para Cusco e nem colocaria os pés em Lima. Hoje, as razões para conhecer a capital peruana são muitas e a principal delas é a comida. O movimento encabeçado pelo chef Gastón Acúrio, que colocou a gastronomia como uma bandeira de identidade cultural e afirmação nacional, hoje conta com a dupla Virgílio Martinez e Pía Leon como os destaques da vez. É deles o Central, sexto lugar na prestigiada lista da revista Restaurant. Em nome da tradição, fomos conhecer o Astrid y Gastón, num lindo casarão branco do século XVIII no bairro de San Isidro, e descobrimos a cozinha incrível de Acúrio, que promove ingredientes peruanos ancestrais com técnicas modernas e uma roupagem bem contemporânea. Uma experiência imperdível.

Mas nem só de restaurantes estrelados se faz a comida peruana. No Embarcador 41, em uma honesta esquina no centro histórico, pudemos saborear um trio de ceviche delicioso. Ali perto fica a elegante Plaza de Armas, um dos mais belos conjuntos coloniais do continente, região declarada Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco em 1991. Construído a mando de Francisco Pizarro, general que no início do século XVI comandou o sequestro e assassinato do último imperador inca, o lugar foi o coração do império espanhol na América do período colonial. Daria para passar três dias só ali, de palácio em palácio, de museu em museu, mas tivemos de eleger algumas prioridades no roteiro e nossa escolha foi o Monastério de São Francisco.

A construção do século XVII esconde impressionantes catacumbas, resquícios do primeiro cemitério municipal de Lima. Arqueólogos contabilizaram a existência de cerca de 75 mil ossadas ali. O conjunto arquitetônico colonial contempla também a Iglesia de La Soledad e a Capilla del Milagro e abriga obras de arte sacras, azulejos sevilhanos e pinturas sem fim. A igreja é uma das poucas construções que resistiram ao terremoto de 1746.   

Quase escondida numa rua lateral, a Casa de Aliaga é uma preciosidade. A mansão de 1535 é habitada há 17 gerações pela mesma família. Estávamos acompanhados por um guia, mas é surreal ver os porta-retratos com fotos recentes indicando que há vida cotidiana ali. Salas com espelhos dourados, lustres de cristal, móveis rococó, louças centenárias, um verdadeiro cenário de época. Os arquitetos curitibanos ficaram simplesmente encantados com a riqueza de detalhes.  

MIRAFLORES 

Começamos este texto com a gastronomia e a história por uma questão de hierarquia, mas em Lima o melhor lugar para ficar é sem dúvida Miraflores. Ali se concentram excelentes opções de hospedagem, ótimos restaurantes, muitos bares e cafés.

Próximo dali está o Larcomar, um amplo shopping de arquitetura arrojada, de frente para o mar, que reúne desde renomadas butiques internacionais a lojas de artesanato de alta qualidade, roupas de alpaca, bijuterias de prata e, claro, mais e mais opções gastronômicas.

Dali é possível seguir a pé pelo calçadão à beira-mar sentindo a brisa do Pacífico no rosto até a Plaza del Amor. Inspirada nos traços do Parque Güell, clássico da Barcelona de Gaudí, a praça conta com a escultura El Beso, de Victor Delfín. Se não fosse o dia nublado, teria sido uns dos melhores cenários de fim de tarde da nossa vida. Aliás, quando o assunto é clima, é bom se acostumar. Lima consegue ser ainda mais complicada que a nossa Curitiba. Lá nunca chove e por conta de uma combinação geográfica muito peculiar quase todos os dias do ano são nublados. 

HUACA PUCLLANA

Uma pirâmide no meio da cidade, formada por milhares de tijolinhos de barro colocados lado a lado, como livros numa estante, mas com o espaço de um dedo entre eles para evitar que desmoronem em caso de terremotos. Lima tem um grande número de sítios arqueológicos escavados e o mais emblemático é a Huaca Pucllana, um grande centro cerimonial feito de barro e erguido entre 200 e 700 d.C. pelo povo que ocupava o que hoje é a capital do Peru.

No coração de Miraflores, seus templos foram feitos há séculos em barro e possuem bases piramidais. Como praticamente nunca chove em Lima, cerca de 30% de suas construções originais permanecem intactas. Vale lembrar que muito antes dos incas, outras culturas já povoavam o território peruano. 

BARRANCO

Para sair à noite, todos os caminhos levam ao tradicional bairro Barranco. Com uma das noites mais badaladas do continente, lá você vai aprender a conjugar o verbo “piscotear”, derivado da bebida nacional peruana, o pisco. De dia é possível conhecer a Ponte dos Suspiros e o Museu Mate, do célebre fotógrafo de moda peruano Mario Testino. 

LARCO

Dos museus históricos, o principal é o Larco, no bairro de Pueblo Libre. Nossa experiência, promovida pelo Núcleo de Decoração do Paraná, foi realmente exclusiva. Com o museu fechado, tivemos uma visita guiada e um jantar no belo restaurante anexo.

Estando em Lima, vale a pena visitar o espaço e dedicar um tempo para ler os didáticos painéis que contam cronologicamente como ocorreu a ocupação humana do território andino há mais de 3 mil anos. O acervo traz cerâmica, joias, artefatos têxteis, armas e tem ainda as salas de reserva técnica, com acesso livre e mais de 45 mil itens arqueológicos. Há também uma ala inteira dedicada à arte erótica, com objetos dos séculos I ao IX. 

Não tivemos tempo de conhecer o Parque de la Reserva, que está no Guinness como o maior parque de fontes dançantes do mundo. Dizem que é imperdível, principalmente o comprido túnel formado por jatos de água e o labirinto de fontes. Fica para a próxima. Afinal, tem muito mais para descobrir por lá.